segunda-feira, 27 de abril de 2015

O Simbolismo da Coruja através dos Tempos - Parte I

Em nosso caminho mágico ordinariamente nos utilizamos de símbolos e imagens que muitas vezes não sabemos ou não pesquisamos previamente sobre, seguindo apenas o senso comum de que tal símbolo quer dizer tal coisa, etc. Ou seja, sem um estudo mais aprofundado. Este pensamento me levou a refletir sobre o significado da Coruja, pois sabia apenas algo superficial e tenho diversas estátuas as quais imbuí vários significados, assim, resolvi sanar minha questão escrevendo. Pela extensão do texto final, resolvi dividi-lo em duas partes.

Enfim, o objetivo do texto é explanar sobre o significado deste lendário animal na mais ampla visão que pude buscar. Espero que o assunto fixe-se em suas mentes e que muitos possam beneficiar-se com os dados. Vamos lá!

Comecemos nossa viagem pela cultura celta, onde Blodeuwedd (nome composto a partir do Galês médio "blodeu", 'flores' + "gwedd" 'face, aspecto, aparência': "face florida") é a divindade da mitologia gaulesa que retrata o poder da terra e sua história pode ser encontrada no Mabinogion em Math, filho de Mathonwy, que diz que ela foi feita a partir de nove tipos de flores silvestres, por Math e Gwydion, para ser a esposa de Lleu (filho de Arianhod).

Blodeuwedd é prometida ao casamento, mas se apaixona por outro rapaz. Com este a divindade planeja matar o seu futuro marido colocando-o em uma situação bastante amedrontadora. Em certo momento, os amantes pretendem jogar uma lança fatal em direção do noivo, então este transforma-se em águia e foge. Após saber do ocorrido, o feiticeiro Gwydion, a transforma em coruja como punição.

Segundo CYMRAES, “In truth, Her supposed treachery creates the very conditions to enable Llew to experience the ritual death and rebirth commonly required of the Druidic priesthood, thus ensuring his kingship.[…] Owl, the totemic representation of Blodeuwedd, signifies the complete transformation of the initiate as represented by Llew’s virtual death and subsequent healing. She is signified by the Empress card of the Tarot. She is a Goddess of emotions, representing the matrix that reforms transpersonal and universal energies into well-defined life force. She is also the Maiden Goddess of initiation ceremonies and is known as the Ninefold Goddess of the Western Isles of Paradise. Flowers, the wisdom of innocence, Lunar Mysteries and initiation are Her provinces.”

Vemos assim, a coruja sendo relacionada à iniciação e ao ciclo de vida e morte. Esta divindade também ficou conhecida como responsável pela noite e patrona das corujas, em alguns textos também sendo descrita como a representação da Lua escura.

Na Grécia vemos a imagem da coruja associada à filosofia e à Deusa Minerva (ou Atena). Aqui é interessante notar como a figura das aves (talvez por estarem mais próximas dos céus, logo, dos Deuses) é presente, sendo relacionada à diversas divindades de diversas culturas. Corvos, corujas, águias e pombos são alguns exemplos.  Minerva é a Deusa da estratégia e sabedoria e é representada
na maioria das vezes com uma coruja em seu ombro ou em seu braço direito.

Segundo DAMASIO (2008) “Em grego coruja é gláuks “brilhante, cintilante”. Um dos epítetos da deusa Athena é “a de olhos gláucos”, ou seja, a que enxerga além do que todos veem.” A coruja é um animal sempre vigilante, sua cabeça tem a capacidade de girar a quase 360° e é um animal de rapina, que analisa sua presa antes da investida fatal, por querer homenagear a Deusa ou por relação à própria cultura gregas haviam moedas antigas que tinham gravadas a figura da coruja.

Relacionada à Filosofia, cita CONCEIÇÃO (2014), “O filósofo alemão Friedrich Hegel em sua obra Filosofia do Direito ilustra muito bem a harmoniosa relação entre a coruja e a filosofia. Escreve ele: “A coruja de Minerva alça seu vôo somente com o início do crepúsculo”. O papel da filosofia é justamente elucidar o que não é claro ao censo comum, é alertar acerca da vida. O crepúsculo é o linear do dia pra coruja, enquanto cessamos nossas obras e nos recolhemos em nossos lares, a coruja “alça seu vôo” a trabalho. É a noite que a fascina, por isso seu nome em latim: Noctua, “ave da noite”. Não é a beleza o seu destaque, mas é a capacidade de ver o que aves diurnas não conseguem ver. Seu pescoço gira 360º, dando-lhe uma visão completa capacitando-a a ver o todo. É também uma ave de rapina, rápida na escolha, e que por ver a presa e não ser vista, sempre tem sucesso na caça, apanhando os despreparados e desprovidos que se arriscam na noite escura.”

Tais características são caras aos filósofos, ver o que ninguém mais consegue, enxergar além do habitual, a capacidade de articular bem seus argumentos com uma visão geral e conduzi-los com maestria.

Na Roma Antiga vários textos afirmam que a Coruja era vista como agouro, ou melhor, o som produzido pela mesma era visto como presságio de mortes. Dizem que as mortes de Júlio César,
Augusto, Aurélio e Agripa, foram anunciadas por uma coruja. Os romanos chamavam a coruja de estriges, que significa bruxa - daí surgiu o nome que abrange essas aves: strigiformes.

Não achei muitas fontes para explicar esta superstição sobre o “rasgo agourento” da coruja. Talvez seja uma analogia, tendo em vista que alguns interpretam como um lamento, talvez pela crença desenvolvida através dos tempos que a relaciona à morte, mas há uma lenda interessante sobre isto.
De acordo com NOLÊTO, “Conta-se que tudo começou com uma jovem de trinta e cinco anos de idade, um pouco gorda e de pele muito branca. A jovem se chamava Suindara, trabalhava como carpindeira (mulheres com mais de trinta anos que eram pagas para chorarem em velórios e cemitérios) e era filha de um temido feiticeiro chamado Eliel. A jovem Suindara era muito inteligente e respeitada na sua comunidade, todos a conheciam como "Coruja Branca". Suindara levava uma vida normal, exceto pelo fato de ser carpindeira.

Os problemas da jovem iniciaram quando ela começou a namorar as escondidas com um rapaz chamado Ricardo, que era filho de uma condessa chamada Ruth. A condessa era conhecida por sua rigidez e era muito preconceituosa. Se o romance de Suindara e Ricardo fosse descoberto, jamais seria aceito pela condessa, mas Ruth acabou descobrindo e arquitetou um plano malévolo para acabar com a relação dos dois.

A condessa mandou que sua empregada Margarida entregasse um bilhete para a carpideira dizendo que contrataria os seus serviços e para isto seria necessário que as duas se encontrarem atrás de uma cripta azul, que ficava no local mais afastado e escuro do cemitério.
Assim que Suindara chegou no loca combinado foi assassinada por um empregado de Ruth. Todos lamentaram muito quando ficaram sabendo da morte da jovem, a enterraram em um luxuoso mausoléu e para homenageá-la esculpiram uma enorme coruja branca no meio da sua cripta.

Eliel, utilizou as cartas de tarô e acabou descobrindo que a verdadeira assassina de sua filha era a condessa da aldeia. Foi aí que ele resolveu executar um poderoso ritual para se vingar da assassina. Eliel foi até o túmulo de sua filha e executou sua magia. O espírito da moça penetrou na
enorme estátua de coruja branca e fez com que ela criasse vida própria. A coruja saiu voando pela aldeia e foi até a sacada da janela do castelo onde dormia Ruth, começou a piar um canto estranho, semelhante ao som de roupa de seda sendo rasgada. Durante toda a noite a aldeia ouvia assustada o som aterrorizante da ave. No dia seguinte a condessa amanheceu morta e suas roupas de seda foram encontradas rasgadas, como se alguém as tivesse cortado.

A partir desse evento, a coruja começou a soltar seus gritos aterrorizantes sempre que alguém estava perto de morrer na aldeia. Até hoje as pessoas ainda temem quando a "rasga-mortalha" sobrevoa suas casas soltando "gritos", pois bom sinal não é.”
Como a boa e velha mitologia, é incerta a data desta lenda, mas pode-se usá-la para explicar esta crendice popular.

No Egito a coruja é comumente associada à Deusa Neith que é a deusa da guerra e da caça, criadora de Deuses e homens, divindade funerária e Deusa inventora na Mitologia egípcia. Seu culto provém do período pré-dinástico, na qual tinha forma de escaravelho, depois foi deusa da guerra, da caça e deusa inventora. Esposa de Set e mãe de Sovek, é muitas vezes comparada à Minerva e em vários textos consta que seu totem também é a Coruja. No Egito Antigo o animal era também representado nos hieróglifos representando a morte (talvez por associação à Deusa Neith).

No Candomblé temos as Iyá-Mi, ou Iyá-Mi Ósorongá, que são traduzidos como “Minhas mães”. São divindades fortíssimas do Candomblé e representam o poder feminino, principalmente o poder gerador. São muito respeitadas nesta tradição, muitas vezes temidas. 

Dizem que ao citá-las quem está sentado deve levantar-se e quem está de pé deve fazer reverência quão grande é seu axé (poder) e são as grandes homenageadas do famoso festival Gèlèdè, na Nigéria, realizado entre os meses de Março e Maio, que antecedem o início das chuvas do país, remetendo imediatamente para um culto relacionado à fertilidade.
“As iyá-Mi tornaram-se conhecidas como as senhoras dos
pássaros e a sua fama de grandes feiticeiras associou-as à escuridão da noite; por isso também são chamadas Eleyé, e as corujas são os seus principais símbolos.” MANUELA (2008).

A tradição dos índios norte-americanos diz que a coruja mora no Leste, lugar de iluminação. Posto que a humanidade teme a escuridão, a Coruja enxerga no breu da noite. Onde os humanos se iludem ela percebe com clareza, acreditavam os índios.

Na bíblia, mais precisamente em Salmos 102:6, Davi diz “Sou semelhante ao pelicano no deserto; sou como um mocho nas solidões. Mocho (coruja) nas solidões representa a solidão noturna atribuída à coruja por viver a noite.


Não diferente dos demais significados, o xamanismo vê a coruja como totem e seu significado como sendo sabedoria, discernimento, dom de clarividência, experiência, cura e capacidade de projetar-se astralmente. 

No próximo texto vamos falar um pouco mais sobre a Coruja nas diversas culturas e faremos as considerações finais. Não percam!

2 comentários:

  1. Excelente discrição e explanação. Tive um contato muito importante com uma coruja, justamente, no momento de uma reflexão. Esta experiência me fez resgatar o conceito de sincronicidade de Jung, a qual, grosso modo, diz, de fato, que nossos pensamentos e ações externas, acontecem de forma simultânea de acordo com o que está na energia circulante da psique. Um abraço.

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